Espaço Cultural
do Povo
Xukurú do
Ororubá

Cacique Chicão

De: Josélia Maria Ramos Wellen (1)

Nosso contato com o Cacique Chicão deu-se através das atividades que desenvolvemos junto ao Projeto UEPB / Povo Xukuru / GTZ.

Ficamos surpresos com o estilo pessoal do cacique. Enquanto falávamos, ele nos dava a perceber que não estava atentando ao que dizíamos, porém, quando tomava a palavra, podíamos observar que não só escutava, mas também digeria todas as nossas informação e críticas. Sua resposta era sempre serena, crítica e coerente, priorizando contudo, o que lhe interessava e a seu povo. Era da forma suave, porém enérgica, que estabelecia suas exigências, o que nos colocava na obrigação de ajudá-lo a desenvolver o povo Xukuru, além de admirá-lo como chefe do povo indígena e amigo de todos.

O cacique Chicão morreu. Entretanto, sua amizade fraterna, demonstrada através de seu espírito solidário e compreensivo junto ao próximo, - uma característica de sua identidade -, não foi com ele. Este dom presente à sua personalidade permanece na memória dos amigos e irmãos índios, fazendo com que eles continuem unidos. Em vida, o cacique fortaleceu a amizade entre os índios e destes com a comunidade de Pesqueira e outras circunvizinhas. Chicão vive em meio ao seu povo! Vive em nós e continua nosso amigo! Ele será sempre um exemplo a ser seguido.

A vida do Cacique Chicão foi tirada de forma trágica, o que aponta as contradições ora vivencidadas pela sociedade brasileira, bem como demonstra o descaso dos poderes constituídos com a questão indígena, ao lado de outras minorias excluídas que tentam sobreviver. O cacique e seu povo traçavam rumos, buscavam perspectivas para a vida nesta sociedade: ele queria que seu povo, massacrado há quinhentos anos, conseguisse respeito e dignidade humana, pois, via o índio, como um cidadão autóctone, um cidadão universal.

Mas, por que esta maneira de ver e viver, esta ação (tão distante de ser efetivada pelos governos brasileiros) teve que ser sufocada, derrotada, assassinada? A própria sociedade brasileira, mostra-nos, hoje, a necessidade de exemplos de líderes, como Chicão, para sairmos do atraso em que nos encontramos. Temos que minimizar as profundas desigualdades sociais e econômicas existentes no seio da sociedade.

O cacique partiu, porém, sua idéia, seu trabalho, seu amor, à causa indígena, estão vivos naqueles que ficaram, naqueles que faziam parte do sonho dele e que sonham com o significado do seu testemunho. Todos, inclusive ele, sonhamos com uma sociedade que viabiliza a vida. E a vida em igualdade de condições, onde os menos favorecidos tenham vez, voto e justiça. A manifestação que o povo indígena e os amigos puderam fazer com pesar, mas também, com muito respeito e carinho, é prova de que eles estão contigo, Chicão, e comungam com a tua vontade. Eles se comprometem em levar adiante o teu trabalho a fim de que o homem se torne cada vez mais homem, cortando as amarras de uma sociedade descriminadora e perversa.

Este pequeno texto que organizamos em prol de tua memória, é exemplo de um pequeno esforço para preservar tua amizade, teu amor pelo povo dos Xukurus de Ororubá, pelos povos indígenas, pelo povo brasileiro!

O cacique está vivo e, com ele, todos os grupos que lutam para que deixe de ser derramado o sangue humano sobre a terra e que, em seu lugar, floresça o espírito de justiça. Que a paz seja fruto de socialização de todos os direitos e de todos os bens!

Que a terra seja de todos os homens que sobre ela trabalham!!!

(1) Josélia Maria Ramos Wellen é membro da Equipe UEPB / XUKURU