Espaço Cultural
do Povo
Xukurú do
Ororubá

OS ÍNDIOS DE PERNAMBUCO

De: Maria dos Milagres Leite Cerqueira (1)

A semana do índio se constitui numa oportunidade de reflexão sobre a capacidade de resistência e por que não dizer a teimosia das diversas comunidades indígenas espalhadas pelo território brasileiro, com uma população aproximada de 250 mil índios em graus diferentes de contato com a sociedade nacional

A persistência desse povo tem sido objeto de preocupação de estudiosos e das organizações que defendem a causa indígena, sem contudo conseguirem fazer valer os seus direitos.

Ao avançar sobre as terras indígenas, as frentes de expansão da sociedade impõe-lhes novas relações econômicas e sociais, destroem-lhes a autonomia política e cultural criando-lhes as mais diversas formas de dependência.

No Estado de Pernambuco encontramos hoje uma população em torno de 17.000 índios vivendo em 7 comunidades como os Fulni-ô no município de Águas Belas numa reserva de 11 mil hectares; os Pankararu, localizados no Brejo dos Padres, entre as cidades de Tacaratu e Petrolândia; os Kambiwás em Ibimirim; os Xukurus na Serra do Ororubá em Pesqueira; os Atikum com 16 aldeias na Serra da Umã em Floresta; Os Truká na Ilha de Assunção em Cabrobó e os Kapinawá em localidade chamado Mina Grande, em Buíque.

O estudo publicado pelo então Condepe em 1981 "As Comunidades Indígenas de Pernambuco" traz um levantamento sobre a situação econômica e sócio-cultural dessas populações. A sua realização deveu-se a uma preocupação com a questão do meio-ambiente; contudo os contatos que realizamos em cada comunidade foram revelando uma realidade muito mais complexa, onde ao lado dos problemas típicos do pequeno agricultor, como a questão da posse da terra, da falta de assistência técnica; revelava-se o sentimento de sua identidade étnica expresso na sua auto-definição como índio; na preservação de alguns traços culturais, como o idioma Yathê ainda falado pelos Fulni-ô; no ritual do ouricuri realizado três meses por ano; nas danças como o Toré, nas lendas e histórias de seus antepassados.

O registro das dificuldades como a falta de escolas, de médicos e sobretudo a falta da "certeza de suas terras", muitas delas envolvidas em conflito com os pequenos agricultores ou fazendeiros da região, foi se ampliando como uma viagem ao passado, e aqueles cabelos falavam dos seus rituais, das lendas e das lutas pela terra como se fosse uma "sina". O velho Antero, cacique Xukuru, apanhando um punhado de capim dizia: "Eis a causa da fome do meu povo ". ... O cacique dos Truká da Ilha de Assunção faz um relato comovente dizendo: "O nosso sofrimento começou com Garcia D’Avila, o grande criador de gado que invadiu com as suas boiadas nossas terras deixando nossos antepassados sem rumo ..." Inesquecível também é a índia Pankararú D. Quitéria, uma liderança política da comunidade, é impressionante a força dessa cabocla na defesa da terra, na luta pela escola para os meninos, na assistência médica para os doentes. Esteve presente no Congresso Nacional para defender os direitos de seu povo, mesmo correndo o risco de três tentativas de morte, repetindo em sua aldeia a história da luta pela terra em nosso país.

Este ano a publicação do Condepe faz dez anos, não será preciso atualizá-la? O que terá mudado? Como vem sendo enfrentada a questão da demarcação e da titulação das terras das reservas? Seguramente o problema continua, recentemente a imprensa local registrou um movimento dos Xukurus exigindo da Funai a retirada de posseiros de sua reserva. Esse fatos revelam que sem uma política de distribuição de terras a situação dos índios continuará se agravando, pois como os demais trabalhadores que vivem da agricultura, terminarão vindo para as grandes cidades para engrossar o contingente de desempregados ou de vendedores de biscates.

Resgatar a história e os direitos dos nossos índios é uma forma também de reencontrar a história do nosso país - que vive momentos de tanta perplexidade e de falta de esperança.

(1) Maria dos Milagres Leite Cerqueira é Socióloga - Técnica em Planejamento.

EM: Jornal do Comércio, Recife: 20 / 04 / 1991